O quê? Você nunca pensou em estudar na Finlândia? Maxwill também não, mas lá foi ele e adorou

Por Maxwill Braga

Na trilha de natureza. Foto: Max Braga O quê? Você nunca pensou em estudar na Finlândia? Eu também não, pelo menos não estava na minha listinha de o que fazer antes de morrer que escrevi aos 13 anos. Como podem perceber, eu não estava bem informado. Aqui vai um resumo da minha experiência para você que também está pensando em fazer uma visitinha ao Papai Noel em Rovaniemi. Não se preocupe ele fala inglês (como quase todo Finn), se dependesse de pedir algo em finlandês, eu só sabia pedir licença: Anteeksi!

Como tudo começou?

Encontrei minha professora finlandesa de Introdução à Sociologia na embaixada da Finlândia. Ela me entregou uma caixa enorme cheia de informações sobre o país. Entre esses materiais encontrei um que divulgava os programas de mestrado.

Já era dezembro, quando encontrei o programa dos meus sonhos chamado Educação e Globalização da Universidade de Oulu. Aí começou a correria. Tradução de documentos. Cartas de recomendação. Escrever carta de intenções e projeto de pesquisa. Atualizar currículo. Pronto. Mandei tudo o mais urgente possível.

Os documentos chegaram no último dia. Ufaaaa! Passei na 1ª fase! Uhuuu! Li tudo que pude sobre educação e sobre a Finlândia. Então veio a entrevista. Estava nervoso. Mas as avaliadoras foram tão gentis que fiquei tranquilo logo no início. Depois de um mês, recebo o e-mail que mudou a minha vida. Aí correria de novo! Buscar bolsa de estudos (que não consegui, mas não foi necessário pois o custo de vida de Oulu é similar a cidades como Brasília e BH), visto, passagem área, apartamento... Depois de quatro meses, tudo pronto!

Chegada em Helsinque...

Cheguei em Helsinque em um domingo de madrugada. O aeroporto estava deserto. Encontrei minhas malas. Ufa! Fiquei na dúvida de como comprar a passagem de ônibus, achando que só podia comprar com celular (doh!, não sei de onde tirei isso).

Na verdade, dava para comprar com o motorista. No ônibus, uma linda finlandesa foi solícita em ajudar-me com as malas até a estação de trem. Fomos sentados juntos conversando por 7 horas. Principal mito foi quebrado no primeiro dia. Sim, os finlandeses também conversam. Não gostam daquela conversa fiada do dia-a-dia. Por exemplo é super normal acordar de manhã e não trocar nenhuma palavra, mas adoram conhecer outras pessoas e conversas mais profundas.

.. e em Oulu

Cheguei em Oulu! Meu tutor estava me esperando na estação de trem. Ele me deu as chaves do apartamento que é organizado por uma empresa associada à universidade.

Nós não precisamos procurar apartamento. Só fazemos uma inscrição na internet e eles encontram o apartamento para a gente. Paguei 200 euros por mês para ter um quarto individual com internet, água, luz, lavanderia, sauna.

A faxina era revezada com os outros dois moradores. Mas nem tudo é maravilhoso. O ap. estava vazio e tive que dormir no chão por dois dias. Mas depois a cama e a mesa chegaram. Ufa!

Amigos do mundo inteiro

Andando de bicicleta. Foto: Max Braga Meu aniversário foi o mais “divertido”, um dia depois: eu, um bolo tijolo e duas velas no formato dos números 2 e 5. Faz parte, depois de algum tempo fiz amigos do mundo inteiro. Na quarta, ouvi que haveria uma apresentação de música no centro. Fui sozinho. A música finlandesa soou muito bem aos meus ouvidos.

Eu tentei aprender o idioma, mas não deu! Na semana seguinte conheci meus colegas de curso. Gente de todos os continentes (exceto Oceania) com diversas formações acadêmicas. Esta turma vou guardar com muito carinho por toda a minha vida.

Apesar de toda a diversidade que nós representamos, nunca (sério mesmo, nunca) tivemos nenhum conflito. São tantas memórias: trabalhos em grupo, debates na sala de aula, preparação para provas, almoços nos restaurantes da universidade, danças, jantares, saunas, festas, caminhadas, esportes, filmes, teatro, passeios, brincadeiras (principalmente na neve), até gincana nós fizemos.

Eita se eu for contar tudo, dá um livro! Então bora lá no que ficou mais marcante na Finlândia, ainda tem os passeios para vários outros países vizinhos, mas que não vem ao caso contar aqui.

Qualidade do sistema de ensino finlandês

O sistema de ensino finlandês se destaca pela qualidade física e humana. Na universidade podíamos pegar quantos livros quiséssemos. Quanto aos livros básicos de cada curso sempre havia em abundância. Os professores são muito qualificados. Todos sempre pontuais, com explicações claras sobre os objetivos do curso.

Havia também aulas no formato de seminários, mas os professores se encontravam com a gente anteriormente para ajudar a preparar a aula. Além da excelente qualidade dos professores e da biblioteca, a universidade disponibilizava excelentes laboratórios de informática com cota de 100 páginas de impressão por mês.

Havia também serviço de carreira para nos ajudar em colocação profissional. A representação estudantil é institucionalizada e é responsável por organizar diversos eventos ao longo do ano. O hospital universitário é excelente para resolver pequenos problemas de saúde. Há inclusive serviço de ortodontia por preço simbólico.

Como estudante de educação também tive oportunidade de visitar o sistema de ensino desde o maternal até o ensino médio. Mesmo no maternal, todos os professores tem mestrado. Para uma turma de 18 crianças, há sempre um pedagogo, um assistente social e um professor(a) auxiliar.

O ensino básico (fundamental e médio) é integral. Além das matérias básicas, os alunos também tem aula de culinária, marcenaria, teatro, música, artes, acesso a vários idiomas e diversos esportes. Todas as salas são personalizadas de acordo com o contexto da disciplina. O aluno se vê imerso em um ambiente onde a aprendizagem flui mais facilmente. Excelentes bibliotecas e laboratórios de informática. Não é à toa que a Finlândia está sempre entre os primeiros no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA).

Ambiente multicultural

O ambiente universitário é bastante multicultural, assim como a cidade que morava. Eu tive o privilégio de conviver intensamente com um grupo de 20 alunos de vários países (Peru, Honduras, Etiópia, Tanzânia, Suécia, Escócia, Romênia, Espanha, Rússia, China, Singapura, Japão) mais vários colegas de outros países dos outros cursos.

Havia mais de 500 estudantes internacionais na universidade que tinha 14.000 estudantes. Consequentemente, todos os encontros tornavam-se oportunidades para comparar e compartilhar experiências de todos os cantos do mundo. Participei da rede de estudantes universitários como coordenador de eventos para integrar os estudantes estrangeiros entre si e com as outras diversas associações finlandesas da universidade.

Muita diversão: futebol na neve, sauna e cabelos congelados

Jogando futebol americano na neve. Foto: Max Braga A atividade mais divertida foi um futebol americano na neve de 50 cm, 20 pessoas para cada lado. Meu time perdeu, mas nunca me diverti tanto. Depois fomos escorregar (com “sledges”) os morros cobertos de neve. Coberta de neve também ficou a minha perna, mas depois tomos aquela sauna deliciosa. Muita saudade da sauna finlandesa.

Quando a temperatura está abaixo de -15oC é muito interessante sair da sauna quentinha (80oC) e ficar na varanda. O cabelo congela quase instantaneamente, mas não sentimos frio pelos próximos 5min, pois o que importa é a temperatura interna do corpo. 

Honestidade e equidade: características marcantes

Outra característica da Finlândia que deve ser exemplo para todo o mundo é o comportamento honesto generalizado e o grau de equidade da sociedade. É muito normal chegar na universidade e pendurar o casaco de frio e outros apetrechos e voltar vários horas depois e tudo está lá. Já deixei celular, carteira, pen drive em cima da mesa e tudo está no mesmo lugar.

Mesmo quando alguma coisa cai na rua, pode voltar no caminho um dia depois que ainda vai estar lá. Talvez pendurado em uma árvore para não molhar (ou seja, o ditado popular “achado não é roubado” não vale na Finlândia).

Como relação a equidade, vale a pena lembrar que a justiça é tanto social quanto de gênero. A questão mais importante para promover equidade é que todas as pessoas independente de qualquer status tem acesso a escolas com um padrão excelente de qualidade. As opções de lazer como esportes, artes, etc. são acessíveis para todos.

Logo que os estudantes finlandeses formam o ensino médio e entram na universidade o estado passa a dar uma bolsa de 500 euros que inclui moradia, mais 50% na alimentação universitária, desconto em museus e teatros e assistência médica quase gratuita. Para os estudantes internacionais, em Oulu, o custo de vida é em torno de 500 euros por mês. Os estudantes internacionais tem prioridade nas moradias estudantis que custam em torno de 200 euros, 50% de desconto na alimentação e assistência médica quase gratuita.

Quanto a equidade de gênero, o mais fascinante é a licença paternidade de até 6 meses que pode ser compartilhada com a mãe. Desta forma, as mulheres em idade de engravidar não são deliberadamente excluídas do mercado de trabalho. Na verdade, o fato de a Finlândia ter equidade social também deriva da equidade de gênero, umas vez que com as mulheres sendo igualmente valorizadas, os recursos são distribuído mais igualmente. 

Harmonia com a natureza

Na trilha na floresta. Foto: Max Braga Por último, outra característica fenomenal da Finlândia é a harmonia com a natureza. Diferentemente do Brasil, não é necessário ir até um parque ou dirigir várias horas para se ter contato com a natureza. A cidade de Oulu, assim como várias outras cidades foram construídas em harmonia com a natureza.

Então sempre que eu pedalava para a universidade ou para o centro da cidade era sempre passando por ciclovias no meio das florestas. Além disso gostei muito de participar do clube de excursões que organiza passeios gratuitos só precisava contribuir com a gasolina e a comida. Fiz um passeio para observar pássaros e outro observar uma nascente. Todas as trilhas muito bem cuidadas e sinalizadas.

Obrigado Finlândia pela experiência maravilhosa. Sentirei saudades!